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Piracicaba (SP): programa incentiva restauração da vegetação nativa e preservação de nascentes em 21 hectares de APPs

Foto do escritor: O Canal da LiliO Canal da Lili

Atualizado: 28 de out. de 2024

O engenheiro agrônomo Klever José Coral, 52 anos, está entre os proprietários rurais atendidos pelo projeto - Foto: Clayton Murillo

Por: Eliana Teixeira


O mundo colapsado apresentado pela série de filmes Mad Max – o primeiro foi em 1979 e o quinto foi em 2024 – remete ao caos da humanidade diante da falta de recursos naturais, entre eles, o hídrico, cujo quarto filme, em 2015, da saga do diretor australiano George Miller, mostra em uma das cenas pessoas sujas e desidratadas num cenário desértico, com a fala apocalíptica de Immortan Joe, o principal vilão de Mad Max: A estrada da fúria: “Nunca, meus amigos, fiquem viciados em água. Vocês sentirão muito a sua falta”. Embora isso seja ficção, evitar a escassez dos recursos hídricos, por meio da preservação e da restauração da ecologia, tem sido cada vez mais urgente em todo o planeta, que já sofre com as alterações climáticas. E Piracicaba, cidade do interior de São Paulo com população estimada em mais de 438 mil habitantes, tem desde 2022 o Projeto de Restauração Ecológica, no âmbito do PSA - Programa Municipal de Pagamento por Serviços Ambientais, que incentiva proprietários rurais a cuidarem do meio ambiente.





Segundo Nancy Thame, secretária da Sema - Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento -, pasta responsável pelo desenvolvimento do Programa e do Projeto de Restauração Ecológica, o PSA-Piracicaba tem por objetivo incentivar, por meio de pagamento e apoio técnico, a oferta de serviços ambientais através da conservação e restauração ambiental das propriedades inseridas nas microbacias produtoras de água do município. “O município de Piracicaba captou recursos dos Comitês de Bacias PCJ (rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí) para o Projeto de Restauração Ecológica de todas as 11 propriedades que participavam do programa (PSA) na época. O Projeto de Restauração Ecológica teve início em 2022 para reflorestamento de 35 mil mudas em 21 hectares de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e é prevista a finalização no início de 2025”, detalha Nancy Thame.


Para a secretária municipal de Agricultura e Abastecimento, a rede de programas da Sema, promove a conservação ambiental e o desenvolvimento sustentável. “Isso envolve a preservação de nascentes em mananciais de abastecimento, a proteção, a conservação e a restauração da vegetação nativa, além da conversão de sistemas produtivos para um manejo mais sustentável”, analisa Nancy.


De acordo com a secretária municipal, para o ano de 2023 foram mais de R$111 mil pagos aos proprietários rurais pelos serviços ambientais prestados em suas propriedades, por meio de contratos referentes ao programa. “Para este ano, o prefeito Luciano Almeida promulgou o Decreto Municipal 19.845/2023 com reajuste dos valores pagos ao programa de quase 38%. A estimativa de pagamento é de R$ 150 mil”, ressalta Nancy.


“Com o olhar para as mudanças climáticas, além do fortalecimento do PSA, tivemos novas iniciativas como a criação do Programa Municipal de Adequação Ambiental, que estende para as microbacias hidrográficas que não são contempladas pelo PSA-Piracicaba, a captação de recursos financeiros, elaboração de projetos e incentivo de proprietários para adequação de suas propriedades. Assim, o novo programa tem enfoque para avanços na agenda da restauração ecológica, no saneamento rural e nas práticas conservacionistas do solo”, detalha Nancy Thame.


Com o projeto, o Coral pôde cercar a área de plantio das árvores da restauração ecológica - Foto: Clayton Murillo

PROPRIEDADES RURAIS

O engenheiro agrônomo Klever José Coral, 52 anos, está entre os proprietários rurais atendidos pelo projeto. A propriedade de Coral, de 25 alqueires, é destinada exclusivamente à pecuária de corte e fica no bairro Campestre, no alto da microbacia hidrográfica do ribeirão dos Marins, uma das mais importantes do município de Piracicaba. “Com relação ao PSA, a gente já vem atuando há mais de cinco anos, desde início na verdade, quando a gente começou a trabalhar, olhando de forma diferenciada em relação ao manejo, curva de nível, adubação. Na sequência, veio esse programa, que a gente tinha o anseio de estar reflorestando algumas partes dentro dessa propriedade. A gente recuperando nascentes, protegendo as nascentes, todo mundo que tiver à jusante vai se beneficiar das águas que correm e que nascem na nossa propriedade”, explica.


Com o projeto, o Coral pôde cercar a área de plantio das árvores da restauração ecológica, impedindo que os animais da propriedade tenham acesso à APP, preservando a vegetação. “Tem os benefícios para a propriedade da preservação, da gente estar trabalhando com o volume de água e também represamento dessa água para utilizar, principalmente, durante os períodos de seca severa. Mas também é importante para quem está à jusante, que pode se beneficiar dessa água que é armazenada dentro da nossa propriedade”, enfatiza.


Em relação ao número de proprietários rurais que participam do projeto, Klever Coral, que também é superintendente da Coplacana - Cooperativa dos Plantadores de Cana do Estado de São Paulo, acredita que poderia ser maior. Para isso, o engenheiro agrônomo aposta na divulgação do projeto entre as entidades apoiadoras. “Já fizemos várias reuniões. A gente faz uma comoção junto aos proprietários, mas muitas vezes acontece o ceticismo. Perguntam: ‘mas o pessoal paga por aquilo que está sendo preservado na minha propriedade?’ Procuramos informar sobre isso, para que cada vez mais, mais pessoas possam aderir ao programa e aí sim, não fiquem os vazios: uma propriedade participa num lugar, pula uma, duas ou outras três em outro, mas sim, dar continuidade em propriedades que façam essa participação dentro do PSA”, avalia.


Propriedade no bairro Monte Branco, do engenheiro civil David Pavani, faz parte do PSA desde o início - Foto: Arquivo pessoal/Davi Pavani

EXECUÇÃO DO PROJETO

A empresa que executa o Projeto de Restauração Ecológica é a Progaia Engenharia e Meio Ambiente LTDA – vencedora do processo licitatório -, cabendo à UGP - Unidade Gestora de Projetos realizar a gestão do PSA-Piracicaba. A UGP tem a função de realizar vistorias e avaliações ambientais nas propriedades e aprovar a análise ambiental das propriedades inscritas no programa. É composta pelas seguintes instituições: Sema - Secretaria de Agricultura e Abastecimento, Simap - Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente, Semuhget - Secretaria Municipal de Habitação e Gestão Territorial, Semae - Serviço Municipal de Água e Esgoto, Cati - Coordenadoria de Assistência Técnica Integral, Comder - Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural, Fundação Agência das Bacias PCJ e Afocapi - Associação dos Fornecedores de Cana de Piracicaba.


COMITÊS PCJ

Dentre as estratégias estabelecidas pelos Comitês PCJ para o alcance das metas do Plano das Bacias PCJ 2020-2035, está a execução de ações por meio de editais de seleção. Segundo a Assessoria Ambiental e a Diretoria Técnica da Agência das Bacias PCJ – responsáveis por operacionalizar os processos de seleção de áreas e empreendimentos relacionados à Política de Mananciais PCJ -, entre as temáticas previstas está a “Conservação e Uso do Solo e da Água no Meio Rural e Recuperação Florestal.


Os Comitês PCJ disponibilizam recursos financeiros da cobrança pelo uso dos recursos hídricos em rios de domínio da União nas Bacias dos Rios PCJ – Piracicaba, Capivari e Jundiaí, para pleitos de projetos de restauração, com base na Política de Mananciais PCJ aprovada em 2015. Esses recursos são destinados aos 76 municípios – Piracicaba é um deles – que integram a Bacia PCJ.


Para o objeto de intervenções ecológicas, os municípios podem pleitear recursos para restauração, cercamento para isolamento dos fatores de degradação e controle de erosões. Além de Piracicaba, o Comitê PCJ destinou recursos para projetos realizados nas cidades de São Pedro, Charqueada, Analândia, Salto, Holambra.


A destinação de recurso é avaliada anualmente. As áreas para investimentos são priorizadas segundo critérios do Plano de Bacias PCJ 2020-2035, com cinco divisões de Muito Baixa Prioridade a Muito Alta Prioridade.


Na avaliação da Assessoria Ambiental e a Diretoria Técnica da Agência das Bacias PCJ, as ações de restauração ecológica, conservação dos solos e saneamento rural, financiadas e constantes nos diagnósticos ambientais dos Pips – Projetos Integrais de Propriedade, são “imprescindíveis” para a proteção dos mananciais prioritários para abastecimento público de interesse dos municípios. “Ajudando numa maior infiltração e percolação de água nos solos, garantindo sua permanência por mais tempo, mesmo que em épocas mais secas, auxiliando também no combate aos danos causados pelas alterações climáticas”.


USO DO RECURSO

Com o pagamento pelos serviços ambientais, Klever Coral comprou fertilizantes para fazer toda a parte de adubação e corretivos de solo. “Inclusive, neste ano, ainda eu quero ver se a gente utiliza os recursos de 2024 para compra de calcário para jogar em toda nossa propriedade. Ano que vem, a gente tem programado recurso para fazer uma cerca de divisa. Todo recurso que obtemos, a gente acaba investindo na própria propriedade para que consiga proporcionar benefícios não só para nós, mas a todo mundo que está no entorno dela”, detalha o engenheiro agrônomo.


Seguindo o exemplo de Coral, o produtor rural Pedro Ildeberto Polizel, 75 anos, também aderiu ao PSA desde o início. Pelos serviços ambientais que realiza no sítio Jatobá, de 56 hectares, no bairro rural do Serrote, recebe anualmente em torno de R$ 10 mil. “Estamos empenhados em ter uma propriedade de acordo com a legislação ambiental. O PSA nos permite fazer um diagnóstico de como estamos e devemos manter, ou melhorar as atividades da propriedade. O recurso é usado para gastos com cercas, terraços e confecção de bebedouros”, detalha o proprietário das terras destinadas à cultura de cana, eucalipto e gado de corte. “Com o programa, melhoramos a água da nossa propriedade. Pretendemos continuar enquanto durar o programa e depois, dar continuidade com as atividades condizentes com o meio ambiente apropriado”, completa.


Em outro bairro rural de Piracicaba, mais precisamente no Monte Branco, onde fica a microbacia do ribeirão Congonhal, o engenheiro civil João David Pavani, 72 anos, também aposta no PSA e no Projeto de Restauração Ecológica. “Nossa propriedade já faz parte do PSA desde o início, pois acreditamos que o futuro está na restauração do meio ambiente”, justifica.


Na propriedade de Davi Pavani nenhuma adequação precisou ser feita para participar do PSA-Piracicaba - Foto: Arquivo pessoal/Davi Pavani

No último ano, Pavani recebeu do programa municipal R$ 7.600 para aplicar na manutenção das condições de solo, tratamento de efluentes e restauração florestal da propriedade de 23 hectares, onde cultiva frutas para comércio e diversidade de produtos para consumo próprio. “Nosso propósito de restauração independe do PSA, tanto que já fazíamos antes do programa. Nenhuma adequação teve de ser feita na propriedade para enquadramento nos ditames do PSA”, afirma o engenheiro, com a certeza de dar sequência às ações ecológicas. “Continuaremos, com certeza, porque faz parte da nossa convicção”, complementa.





VISTORIA NAS PROPRIEDADES

A equipe instituída na UGP - Unidade Gestora de Projetos/PSA realiza, tanto as vistorias das propriedades inscritas no PSA-Piracicaba, quanto às ações previstas no Projeto de Restauração Ecológica no âmbito do programa. “Na primeira, o objetivo da visita é verificar as condições ambientais apresentadas nos Projeto Ambiental Individual de cada propriedade, bem como atuar na indicação de melhorias necessárias para maior geração de serviços ambientais para a sociedade. Nas visitas da restauração ecológica, o intuito é verificar a execução das ações do projeto que estão especificadas no contrato de prestação de serviço”, detalha o engenheiro florestal da Sema, Ramon Pittizer.


De acordo com Pittizer, nas vistorias às propriedades, a equipe observa as condições de vegetação, o estágio de desenvolvimento das matas, o nível de conservação e as práticas realizadas nas áreas produtivas, se as construções possuem algum sistema de tratamento dos efluentes líquidos e a destinação dos resíduos sólidos. “No decorrer do programa, tivemos alguns participantes que não quiseram continuar e outros proprietários que estão até hoje. Lembramos que neste período, vivemos a pandemia da Covid-2019, que afetou vários programas”, conta.


Mata ciliar no bairro Monte Branco - Foto: Thais Passos/Sema

Na manutenção dos plantios do Projeto de Restauração Ecológica, detalha Pittizer, são previstas e executadas ações de roçada do capim, coroamento do entorno das mudas, replantio das falhas, controle de formigas cortadeiras, adubação de cobertura, entre outras. “Observamos que ao longo da execução, os proprietários que moram nas propriedades e aqueles que têm um bom entendimento do objetivo do projeto, os plantios se desenvolvem melhor do que as demais áreas”, analisa.


Em relação à remuneração parcial ou até mesmo total que é recebida pelos proprietários, o engenheiro florestal destaca que os valores são reinvestidos em melhorias para geração de mais serviços ambientais. “Isso é muito legal! Constatamos que propriedades melhoraram as suas práticas produtivas, aumentaram suas áreas de matas com reflorestamento, e também realizaram o saneamento dos efluentes líquidos das construções. De modo geral, estamos muito satisfeitos com os resultados do programa”, garante Ramon Pittizer.


PERSPECTIVAS PARA O FUTURO

Na avaliação de Ramon Pittizer, as ações de restauração ecológica, bem como todo o Programa Municipal de Pagamento por Serviços Ambientais e também o mais recente, o Programa de Adequação Ambiental Rural, são extremamente importantes tanto para o meio rural quanto para o ambiente urbano. “Essas ações contribuem para alcançarmos um meio ambiente equilibrado, gerando serviços ambientais como, por exemplo, a regulação microclimática da temperatura, a regulação da variação hídrica da cidade, diminuindo a ocorrência de extremos de escassez hídrica ou grandes enchentes, minimiza também o assoreamento da calha dos rios e córregos, entre outra série de benefícios ambientais que melhoram a qualidade de vida da população”, enumera as vantagens das ações ecológicas.


Como perspectivas para o futuro, o engenheiro diz que a Sema almeja a expansão do número de propriedades participantes. “Mas sabemos que isso só irá acontecer, se conseguirmos mudar o olhar dos proprietários para a necessidade da conservação dos recursos hídricos e do meio ambiente, de modo geral. Por isso, já estamos com um novo projeto com recursos dos Comitês PCJ e da Prefeitura de Piracicaba, em vias de ser iniciado, para a prospecção de 50 novas propriedades nas microbacias do Marins e Congonhal”, anuncia.

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